terça-feira, janeiro 31, 2006

Cúmulo do paradoxo II

Querer mudar tudo, tudo, tudo, de uma ponta à outra, e por isso não mudar nada.

Cúmulo do paradoxo

Ser tão irresistível, tão irresistível, tão irresistível, que as pessoas têm de manter uma distância de segurança para não serem atraídas.

Anedota IV*

Vira-se o coração para as tripas:

- Vou-te colonizar!

E aí começou o "síndrome do cólon irritável", também conhecido por fazer das tripas coração.



* Um grande bem haja à marta, à minha boa amiga, ao meu paizinho e à prima que se ofereceram prontamente para me dar a mão.

domingo, janeiro 29, 2006

Interpretação perfeita





Depois das t-shirts, da tela, do salsichinha, tenho agora mais uma peça extraordinária da lojinha, feita especialmente para mim. A minha boa amiga é que sabe. Obrigada!

Resposta múltipla

O que tornou este fim de semana memorável?

a) o sporting;
b) o chiado e a promoção do Caso Thomas Crown na Fnac, "Do you want to dance? Or do you want to DANCE?";
c) a neve [que maravilha, que maravilha];
d) o aniversário do meu pai;
e) nenhuma destas, mas sim ver a Kim Cattrall (a samantha do "sexo e a cidade") na "Academia de polícia" de 1984 e perguntar-me por que é que, com uma música tão boa, os anos 80 foram tão foleiros, e como é possível uma cabimba aos vinte anos transformar-se numa cabomba aos quarenta;
f) ouvir este diálogo do Hollywood Ending
"Val: We had sex.
Ellie: Yes, we had sex. But we never talked.
Val: Sex is better than talk. Ask anybody in this bar. Talk is what you suffer through so you can get to sex.";
g) todas estas;
h) estas e outras;
i) memorável?

sábado, janeiro 28, 2006

O meu lado woody allen strikes again

Não sei se é por causa da "alteração do equilíbrio oculomotor perto", mas tenho um problema com as curvas.

Faço uns parêntesis. Sou uma condutora nata, uma steffi graf da estrada, um portento na condução de cidade. Conheço os melhores caminhos, trato bem os peões e até às vezes os outros condutores. A primeira vez que pus as mãos no volante há mais de dez anos, no (não tão assim) saudoso Fiat Tempra dos meus pais no parque de estacionamento da praia de Manta Rota, o meu pai disse-me: "ou se nasce com isto ou não se nasce e tu tens o que é preciso". A minha instrutora de condução ensinou-me a enganar radares de controlo de velocidade e, na segunda circular, o outro instrutor esgotou as possibilidades de mudança de fila em menos de um minuto. Sou destemida, mas ainda assim prudente - respeito as regras no limite que me permitem. Tenho uma condução defensiva com camiões TIR e uma condução arrogante com os outros ligeiros da cidade. Pronto, acho que posso fechar parêntesis, já perceberam que sou boa condutora e que é um assunto que não podem abordar.

Mas, vá lá saber-se porquê, tenho um problema com as curvas. Não as de saída ou de entrada de auto-estrada, mas sim com as pequenas curvas de mudança de direcção na cidade de Lisboa. Subo constantemente passeios por simples falta de cálculo.

Bom. Hoje o dia até me estava a correr bem. Vinha do Chiado. Não há coisa mais bonita que o Chiado. Estava mesmo a chegar a casa e, numa curva para a minha rua, deu-se-me para aquilo. O carro saltou. A minha coluna fez ai, ai. Percebi que não tinha subido o passeio, mas sim um pilar de pedra. Não parei imediatamente. Parei à porta de casa e, quando me comecei a queixar ao meu irmão, acabado de chegar, do meu disparate, apontei para a roda. Pois que o pneu já estava a esvaziar, pois que a jante já estava bem, mas bem, debilitada - não havia dúvidas, tinha um pneu furado e eventualmente uma jante a deitar para o lixo. Olhei para o meu irmão, lembrando-me que ainda nem há dois meses tinha sido ele a mudar-me outro pneu furado, e insultei a minha inteligência. Graças a Deus que não tenho sempre furos quando estou com ele, mas felizmente ele está sempre por perto quando furo um pneu.

Agora, inesquecível será sempre aquela curva, tão simples de virar, tantas vezes contornada sem problemas. A minha cabeça não estava lá, isso eu sei, e o meu automático é demasiado totó.

sexta-feira, janeiro 27, 2006

Metamorfoses da frase feita

Quando alguém diz

"depois queixa-te"

e em vez de querer dizer

"não fazes como eu te estou a dizer e depois vais ver",

quer dizer sim

"olha, se não te queixas agora, ao menos quando chegar a pior altura, por favor, diz qualquer coisa".

Golpe de rins

Como se não bastasse a preocupação alheia e o mal estar, isto convenceu-me. Sou das que precisa de motivações maiores. Prefiro pensar que o corpo me está a dizer qualquer coisa existencial, em vez de algo meramente clínico.

Já marquei a consulta (sosseguem). Tão cedo não volto ao soro, o meu melhor amigo da medicina ocidental e grande tentação.

quinta-feira, janeiro 26, 2006

Definição em paradoxo

Tendo para criar ficção realista.

O que eu não faço pelo estilo

A.M. - Estás com mais cabelos brancos.
Eu - De ontem para hoje, acredito.
A.M. - Não digo de ontem para hoje. Mas no último mês.
Eu - Hum...

Fui até à wc, olhei para os meus brilhantes cabelos brancos no meio da minha fantástica cabeleira negra e, mesmo achando que estavam na mesma, pensei: "será? hiiii, que fixe, ao menos isso! há males que vêm por bem." Depois fiz a dança da vitória.

quarta-feira, janeiro 25, 2006

Okay?

Ao telefone.

Ele - Olha, encontrei o fato que me deste, o da abelha.
Eu - Ah, o fato de abelha do Carnaval. Olha, tens de começar a pensar no que te queres mascarar este ano. Está quase.
Ele - Hum...
Eu - Bom, pensa nisso e depois diz-me.
Ele - Ah, quero mascarar-me de mosca.
Eu [oh Deus] - Mosca? Mosca é tudo preto, não tem piada. É muito parecido com abelha.
Ele - Hum... então escaravelho.
Eu [raça dos livros] - Eheheh, escaravelho, escaravelho? Também é todo preto. Pensa melhor. Não me precisas dizer já, está bem?
Ele - Ou de fantasma!
Eu [obrigada, meu Deus, pela tua clemência] - Fantasma! Muito bom! Isso é só um lençol e dois buracos.
Ele - Mmm mmm. Tive outra ideia!
Eu [oh não] - Diz...
Ele - De peixe, quero mascarar-me de peixe.
Eu - De peixe? Ah muito bem, de peixe. Mas depois dizes-me.
Ele - Espera. De peixe, ou então de tubarão. Ou então tubarão martelo. Ou peixe espada.
Eu - Peixe espada! Grande ideia.
Ele - Ou então um animal forte. Um leão ou um tigre!
Eu - Eu vou procurar, então. Depois falamos. E tu vai pensando.
Ele - Tem de ser um destes que eu disse, okay?
Eu [cara de messenger]- Sim, claro.



Ontem, ao telefone.

Eu - Então, já te lembraste de mais alguma coisa que te queiras mascarar?
Ele - Procuraste?
Eu - Não, ainda não.
Ele - Tinha-te dito para procurares.
Eu [ups] - Estava à espera que pensasses melhor. Pensaste em mais alguma coisa?
Ele - Sim, tive uma ideia espectacular!
Eu - Espectacular? Conta.
Ele - Quero mascarar-me de árvore.
Eu - Ah, árvore! Já o ano passado tinhas falado de te mascarares de árvore. E mais?
Ele - Ainda faltam duas mãos cheias de ideias. Eu vou-te dizendo e depois tu decides.
Eu - Está bem, eu vou procurar.
Ele - Sim e depois eu digo-te as duas mãos cheias de ideias e decidimos. Okay?
Eu - Okay, okay!

terça-feira, janeiro 24, 2006

Freud ao pequeno-almoço

Uma das melhores coisas de ver alguém ao acordar é contar um sonho.

Fica retido e não se perde na imensidão da irrealidade. Todo o dia fica com um novo nível de sentido, não necessariamente total e abrangente, mas inevitavelmente enriquecedor.

segunda-feira, janeiro 23, 2006

Lights off




Para descompensar tudo e mais alguma coisa, dei-me nesta hora de almoço uma pequena prenda. Marilyn Monroe Unseen Archive tem fotos e fotos da loura.

Ocorreu-me, enquanto o folheava, que provavelmente toda a aura de Marilyn reside no facto de ter o lado negro tão exacerbado, além do triste final que teve. Pressente-se a fatalidade, entrevê-se a escuridão e auto-destruição de tão belo ser.

De forma doentia, não há nada mais atraente.

domingo, janeiro 22, 2006

Mas porquê? PORQUÊ?

Estou como a outra sujeita ontem no cinema que, perante o facto de o filme que pretendia ver estar esgotado, soltou irritada o seguinte desabafo Detesto quando as coisas não correm como eu quero.

Pois.

Tirando a terrível questão estética, tirando o facto de pela primeira vez desde o 25 de Abril irmos ter um Presidente da República de direita, tirando ainda o facto de termos de levar novamente com o homem que já tinhamos conseguido expulsar ao fim de dez anos, o mais grave nestes resultados é para mim o travão que este senhor vai representar para o progresso de mentalidades que tanto precisamos. Não acredito que o senhor vá parar medidas económicas e financeiras austeras, nem fazer mossa na política internacional (só mau aspecto, mesmo), acredito sim que vá impedir uma política cultural e social progressista. Parecia-me, talvez ingenuamente bem sei, que havia chegado o momento de desbloquear algumas questões fundamentais da vida portuguesa. O país que eu quero é um em que a despenalizaçao do aborto vence, em que os homossexuais casam, em que se cumpre uma ideia de democracia através das minorias e de acções culturais e artísticas. Esse senhor representa o contrário disso tudo. Representa, como mostram à partida os resultados, a clivagem entre rural e urbano, entre interior e litoral - representa a ignorância de um povo em vez da sua sede de saber. Por que raio insistem tanto os senhores em falar de "presidente de todos os portugueses"? Que tanga é essa? Ele representa, representará, infelizmente, Portugal e os portugueses num certo sentido, mas não é nem nunca será o meu presidente. Um homem, presidente ou não, é suposto ter causas. Se este senhor as tiver, não serão com certeza as minhas.

Que merdum de noite eleitoral, já vos digo. Jornalistas idiotas, discursos fúteis e nervosos, a vontadinha de pegar no pequenino e no mesquinho, grrrrrrrr. Se fosse a votar em conformidade com o discurso da noite, não hesitaria, votaria Soares - o discurso dele esteve a anos luz de qualquer um dos outros. Só é vencido quem deixa de lutar. Pois então lutemos.



De qualquer modo, pegando na sabedoria do meu pai, nem tudo está perdido. Afinal, como ele bem disse antes de eu sair para evitar o discurso do futuro presidente, ainda é cedo, a tomada de posse é só em Março e, até lá, ainda pode ter um ataque cardíaco.

Loop

Sempre que tropeço numa sensação o que tu queres sei eu, não consigo continuar o meu caminho. Parece sempre que o conhecimento não me basta para seguir em frente.

E fico para ali a saber que tu sabes que eu sei o que tu queres. Sem desbloquear nem fazer nada de um tal conhecimento.

É um tropeção, não é um atropelamento. Fico a constatar o óbvio à volta, em torno, em cima, em baixo, de lado. Ah, o que tu queres sei eu, é que é isso mesmo, o que tu queres, ah, isso, ah pois, o que tu queres, sim, sim, estou a ver, ahah, eu logo vi, não me enganas, então então, é isso, está visto, então não, pois pois, tu não estás a ver, eu bem sei, mas mas é tão óbvio, tu queres ver, olha que eu topo-te, tou-te a ver...


Dá origem a grandes momentos, que travam e aceleram numa medida improvável os meus passos. Às vezes dá-me para escorregar e desbloqueia-se o loop. Vou pelo caminho da ignorância, que é menos paralisante.

sábado, janeiro 21, 2006

Uma boa educação

Hoje a caminho do Pingo Doce, na Rua da Graça, deparo-me com uma velha com duas crianças. A mais velha, uma miúda, apertava os cordões dos sapatos do irmão mais novo, talvez com uns cinco, seis anos. A ranhosa da velha, alto e bom som para toda a gente ouvir, disse:

- Sim, faz o laço ao teu irmão. Ele não sabe fazer nada. Não sabes apertar os sapatos, não sabes limpar o rabo. Não sabes fazer nada. Qualquer dia digo a toda a gente o que não sabes fazer. Escrevo num papel, para toda a gente ver, e ponho no teu quarto. Vais ver...

Assim se forma, à custa de muita humilhação, mais uma geração de gente insegura e infeliz*.



*Tal e qual como a puta da velha.

sexta-feira, janeiro 20, 2006

Visita nº2 - A vida a imitar outra vez

Deu a Rita Dunn alguns segundos para digerir a surpresa. As pessoas nunca lhe diziam "Não imaginei que fosse negra quando falámos ao telefone." Mas era o que toda a gente pensava.

Quem o pensa é Cat, uma das personagens principais do último livro de Michael Cunningham, Dias exemplares. É negra e tem este pensamento quando se apresenta pela primeira vez ao vivo a alguém com quem falou ao telefone.


Hoje, enquanto esperava pela agente imobiliária à porta da casa que íamos visitar, lembrei-me da Cat. Lembrei-me, porque não conhecia a agente com quem já tinha falado várias vezes ao telefone. Lembrei-me que, de facto, ela podia ser negra. Tinha uma bela voz.

Chegou. Apresentou-se. Não sei se me deu alguns segundos para digerir a surpresa. Não sei se a mostrei. De facto, a minha agente era negra. E eu estava era surpreendida por ter adivinhado.

quinta-feira, janeiro 19, 2006

Visita nº1 - Shame on me!

Hoje fui ver uma casa. Chegámos ao mesmo tempo que a polícia.

A vizinha de baixo, "já velhota" nas palavras do proprietário, tinha morrido.

O timing não podia ser mais adequado, parece-me.

A descer as escadas, só me ocorreu o seguinte: parece que vai haver mais uma casa à venda. Assustei-me com o meu humor mórbido, mas não deixei de me rir por dentro.

Por que amo a língua portuguesa IV

Quando alguém diz pela parte que me toca, desenvolvo logo a minha faceta táctil.

quarta-feira, janeiro 18, 2006

Control freak

Os meus telefonemas para o puto seguem normalmente a mesma sequência de perguntas. Com nuances, obviamente, pois tratando-se de uma criança de quatro anos dada a pensar sobre a vida, nunca se sabe o que virá a seguir. Na verdade, as perguntas são dele. Eu só consigo perguntar o que ele está a fazer, se está bem, etc. Talvez por se ter acostumado às distâncias, também se habituou à conversação ao telefone e, por imitação ou não, estabeleceu um estilo próprio.

Começa com um "onde estás?", depois segue-se "estás com quem?", "o que estás a fazer agora?", "o que vais fazer a seguir?". Estas são as básicas mas tem diferentes variações. Por exemplo, se lhe digo que estou em casa, ele pergunta-me em que parte da casa. Se lhe respondo, agora estou a falar contigo ao telefone, ele quer saber o que fazia antes e o que vou fazer imediatamente a seguir. Se digo que saí do trabalho e estou a ir para o carro, ele quer saber onde exactamente. Enfim... é muito controlo.

No último telefonema, quando lhe disse que estava a entrar no carro, perguntou-me com quem estava e eu disse sozinha (o que é sempre melhor do que quando estou no trabalho e ele quer saber o nome de todos os meus colegas). Não esperava o que se seguiu. Perguntou-me "por que é que estás sozinha?". Fixe, puto!, porreiro, bela maneira de acabar o dia, a pensar nessas coisas. Respondi apenas, ah porque vou para casa e vou sozinha no carro. Para descansá-lo e não pensar que sou um ser solitário e infeliz, disse que ia jantar com a Inês, a prima. Pois bem. Logo me disse: "então quando chegares ao pé dela, diz para ela ligar à avó que quero falar com ela". Primeira vez que tal coisa aconteceu, mas fiquei contente. Ah está bem queres falar com ela.

Sim, quero saber se ela está bem, se não está doente, o que é que está a fazer.

Ri-me para dentro. Obviamente a Inês ia sofrer o mesmo rol de perguntas habituais. O estar doente é nova, mas de qualquer modo sintomático da sua preocupação precoce de médico (que é o que diz que vai ser, como o tio - ora bem hajas tu, vasquinho, que dizes que nunca falo de ti, aqui está, já viste?).

Chego a casa. A Inês liga. Ele despacha-a com uma velocidade, só visto, e volta a falar comigo. E segue-se o ritual, mas estás ao pé da janela? ao pé do vidro? dentro ou fora?. No final, disse-me para ligar-lhe quando me fosse deitar. Mas mas mas... ó Dinis, se calhar é melhor tu ligares-me a mim quando te fores deitar que eu deito-me mais tarde. Assentiu, não sem antes reclamar uma última explicação "vais deitar-te a que horas?".

Por osmose...

...acontece-me algo bizarro e doce.
Quando alguém me diz, acerca da coisamailinda da minha boa amiga, o meumainovo, que é lindo, adorável, maravilhoso, eu fico babada, babada, babada até mais não.

É como se, no fundo, achasse que contribuí de alguma maneira para a sua beleza. E como quero continuar a fazê-lo.


(aqui entre nós, boa amiga, cartola, cartola!)

terça-feira, janeiro 17, 2006

É obvividente*!

Ocorre um fenómeno estranho nestas presidenciais. Aliás, ocorrem muitos, mas este é particularmente interessante para mim.

Quase nunca falo mal do Cavaco entre os meus amigos e família. Quase nunca ouço falar mal do Cavaco. Tirando este incompreensível caso, a única reacção que a palavra cavaco provoca é um esgar de náusea, um rol de impropérios e difamações, um olhar para o céu pedindo clemência e boa vontade, um choro incontido, um encolher de ombros causado pelo desespero, uma conformação a uma verdade infernal. Porquê? Porque é, para todos nós, óbvio e evidente que o Cavaco é um asco, um ser abjecto, uma pequena barata que desprezamos mas que nos sobrevive, um feio, um baboso, um desdenhoso, um idiota. Nunca odiei tanto um político, até aparecer o Santana, como odiei, nos meus dias de juventude, esse senhor cavaco, esse homem, essa figura, esse sujeito.

Não falamos dele. Discutimos qual será o melhor candidato de esquerda, pegamo-nos até se for preciso, mas é só para manter algum fervor político. Insistimos em ignorar esse homem, com medo que o reconhecimento dele comece cedo demais.

Pergunto-me, em momentos de absoluto provincianismo da capital, por que ganhará ele, se entre os meus não há quem nele reconheça sequer a linha no boletim de voto? Obviamente que o provincianismo cessa e compreendo. O cavaco não é para os meus, nem nunca será. O cavaco é para alguém que desconheço ou, pior, é para alguém que não quero conhecer. E aí, assusto-me, porque me confundo com os snobs da esquerdalha ou com os intelectuais de esquerda ou com a arrogância dos iluminados.

Assusto-me. E por isso prefiro blasfemá-lo, insultá-lo, pontapeá-lo com as palavras. Assim me alivio. Assim volto a ser massa votante. Convido-vos a fazerem o mesmo...



* Óbvio e evidente. Contribuição da Inês, a prima, citando, ao que parece, um professor de Geografia que teve na escola.

segunda-feira, janeiro 16, 2006

Sou das que se pensa, não das que se fala

Devia ser proibido sentir tanto frio nas orelhas.

Das duas, uma:
- ou está mesmo muito frio;
- ou entre as 14h05 e as 14h21, não estava ninguém no mundo a falar de mim (estranho e improvável, mas possível).

De qualquer modo, para a próxima levo o chapéu.

Por que amo a língua portuguesa III

Quando estou à nora, apetece-me sempre dizer que estou ao genro.

sábado, janeiro 14, 2006

Orgulho das nuances

Sou irmã mais nova. Não sei se já disse aqui, mas sou irmã mais nova. Poderia ser irrelevante, apenas um dado estatístico dispensável em qualquer formulário de candidatura a seja o que for, mas não é. Mesmo que eu não acreditasse na análise, não seria irrelevante no meu caso. Ser irmã mais nova é uma das coisas que me define, um dos alicerces base da minha auto-definição pessoal, contorno essencial da minha sociabilidade, do meu estar no mundo.

Tenho um mano velho, é bom de se dizer. E isso também define tudo, não são dois nem três, não é uma irmã, é um irmão mais velho. O meu irmão mais velho foi o meu modelo para tudo, desde sempre, para o bom e para o mau, para o que queria e não queria ser. O meu modelo de virtude, o meu modelo de pecado. O meu modelo.

Crescer com, principalmente quando não se tem um caminho traçado e quando não se sabe para onde se vai - dos 0 aos 18, 20, 30?, bom depende, não interessa - crescer com, dizia, é ser com. Com o meu irmão mais velho, comecei a ser, fundei aquilo que sou hoje, em todas as suas formas primordiais, antes sequer de poder sabê-lo.

Orgulhosos de ser quem somos é escolher um caminho. Orgulhosos de sermos com é voltarmos a crescer com, depois do caminho escolhido. O meu caminho passa pelo teu, porque assim o escolhi. E cresço novamente contigo, crescemos agora um com o outro, num sentido muito mais livre. Finalmente livre.

Esse é o meu orgulho hoje, depois de te ver ontem tão bem amado, tão bem cuidado, tão bem olhado, tão bem acompanhado. Estou feliz, feliz da vida, por nos termos escolhido um ao outro, uma vez mais. Nada, hoje, me daria mais prazer.

sexta-feira, janeiro 13, 2006

Eis a questão

Aguente-se.

ou não?

Lucky day

Adoro sextas-feiras, trezes.
Antes também gostava de passar por debaixo de escadas, mas depois comecei a ter mais respeitinho - a cagufa é um sentimento muito honroso.

Mas das sextas-feiras, trezes, gosto mesmo. É uma espécie de desafio. É como se, de facto, o dia fosse pejado de coincidências e azares, sendo a missão escapar intacto e, quem sabe até, ter algum proveito bem-aventurado, ou não se tratasse tudo isto de um equilíbrio de forças ocultas. Então, sendo assim, sinto-me, mais uma vez, uma espécie de Beatrix Kiddo, sem espada de samurai, a desafiar os meus oponentes - neste caso, eu própria com a minha tendência para o caos. Sextas-feiras, trezes, sem conseguir evitar, levanto-me a dançar e a cantar, não porque me tenha instruído no dia anterior a fazê-lo, mas porque a força da missão grita o meu nome. É um chamamento.

Ontem, já o intui quando fui mandada parar por uma operação stop já depois da meia-noite. Caso a boa-aventurança não estivesse comigo, ter-me-iam mais uma vez passado a célebre multa das moradas soltas e não coincidentes. Mas não. Está tudo conforme foram as palavras do senhor agente. O sujeito, mais à frente, com uma espingarda (ou lá o que é aquela merda) na mão, intimidou-me um pouco, mas sabia que dificilmente hoje seria um bom dia para levar um tiro.

Eis senão quando (hoje de manhã), chego ao carro e deparo-me com a minha carteirinha (com dinheiro e cartões de crédito) bem visível no banco do morto, mas o carro incólume. Mais uma vez, azar porquê? Nada! Desafiei, com a minha desmiolice, a sorte e eis que ela me bafeja sem pudor, deixando-me até um pouco corada.

E ainda agora é cedinho. O dia apresenta-se longo, assim como a noite, mas não esmorecerei. A bem-aventurança acompanha-me e eu, com o meu fato de treino amarelo, estou atenta, ah pois estou!

quinta-feira, janeiro 12, 2006

Manter a distância

"Alteração do equilíbrio oculomotor perto" é o que diz o relatório do rastreio oftalmológico que me fizeram. Já suspeitava. Há algum tempo que percebo que sempre que estou perto de alguém começo a perder o equilíbrio. Principalmente, o oculomotor, mas não só. Começo a ver em duplicado, a topar coisas que não estão lá, a ver mais além.

Concluem com um simpático "situação a justificar avaliação clínica".

As coisas que eles vêem por me olharem os olhos.

quarta-feira, janeiro 11, 2006

Apoliticamente falando

Começo-me a sentir "como uma pessoa que está a escrever dentro de uma casa em chamas sem nunca mencionar a palavra fogo" ou como se só eu é que o visse e de nada me adiantasse gritar.

Grita fogo!

Qualquer livro é inescapavelmente político, no sentido moral, mas, até há pouco tempo, o abertamente político parecia-me não ter lugar numa novela. Sempre achei que a minha obrigação como cidadão era lutar contra as políticas do Ronald Reagan, a minha obrigação como escritor era perceber como é ser Ronald Reagan. Sempre achei que a ficção pedia uma certa amoralidade e que era o nosso melhor meio para perceber a forma de pensar de pessoas muito diferentes de nós. Hoje percebo que isto só é verdade até certo ponto. À medida que as coisas ficam muito mal – como ficaram nos Estados Unidos –, começamos a sentirmo-nos como uma pessoa que está a escrever dentro de uma casa em chamas sem nunca mencionar a palavra fogo.

Michael Cunningham, Entrevista Milfolhas, Público, 3 de Dezembro de 05

Agora escolha III


Louras?




Ou morenos?




Eu já decidi. E, embora goste muito dos dois e sejam ambos mandatários da minha juventude, não é para os seus "velhinhos" que vai o meu voto.


Por razões alheias à vontade desta que vos escreve, a foto da loura é consideravelmente maior que a foto do moreno. Não se tome por isto que há, neste blog, qualquer preferência pelo candidato da qual a loura é mandatária da juventude. Em relação a preferências por louras... bom, julguem como entenderem.

É de acetar!

Luz de inverno*

O Porto, para mim, é cinzento, não consigo evitar. Mesmo, nestes dias, só estando lá de noite, a cidade não tem a luz que preciso.
Na Póvoa do Varzim, a luz vem do mar também e com este sol ofusca. Mas o frio é demasiado para se celebrar a luz.
Na viagem de regresso para Lisboa, apanhei o tempo todo o sol a bater-me na cara. Estava um conforto quente, que só no inverno é possível.

Hoje, ao meio-dia no Marquês de Pombal, voltei a reafirmar a minha predilecção pela luz de inverno. Não há como escapar. E percebi, mais uma vez, porque quero mudar de casa. Quero aquela luz para mim.


*ou Composição

sexta-feira, janeiro 06, 2006

Indecisões

Antes caso perdido que caso arquivado?

quinta-feira, janeiro 05, 2006

Caso me fartasse das palavras

...ou elas deixassem de ser praticáveis, seria possível uma correspondência silenciosa?

Se sim, seria editável?
Se sim, em que formato?

Lost in translation VI

No restaurante, eu e o meu amigo K a vermos a ementa.

K - Olha, tem polvo à lagareiro. Isso faz-me lembrar boas coisas.
Eu - Eh, o Alcaxete.
K - E tem bacalhau à lagareiro também. Lagareiro é o quê, o molho?
Eu - Sim, com azeite e alho. E também a maneira de ser cozinhado, é assado.
K - Ah, e tem grelos. O que é grelos?
Eu - Grelos é uma couve, tipo espinafres, mas mais amargo. [sorriso maroto] Também pode chamar-se grelo a outra coisa.
K - Ah sim? O quê?
Eu [olhando em volta] - No calão, grelo é vagina.
K [a rir-se] - Hum, se calhar é melhor não comer.
Eu - Come, come. Assim uma vez, de vez em quando, também não te vai fazer mal!

Por que amo a língua portuguesa II

O paradoxo da frase:

Andas a roçar o pudor.

Por que amo a língua portuguesa

Tu provês e eu provo.
Prova que me consegues prover.
Já me enfiava com o provedor no provador.
Eu bem que provava o que provém de ti.
Tu provaste mas eu fiquei por vir.

quarta-feira, janeiro 04, 2006

Resposta múltipla

Nos últimos dias, sinto-me sliding. Só hoje consegui verbalizá-lo.

Fui ao dictionary.com e, depois de ver os potenciais significados, decidi deixar-vos adivinhar em que sentido metafórico estou a sentir esta palavra. Gosto de palavras que contém sentimentos antagónicos, mesmo que num mesmo sentido.

To slide
1. To move over a surface while maintaining smooth continuous contact.
2. To coast on a slippery surface, such as ice or snow.
3. To pass smoothly and quietly; glide: slid past the door without anyone noticing.
4. To go unattended or unacted upon: Let the matter slide.
5. To lose a secure footing or positioning; shift out of place; slip: slid on the ice and fell.
6. a) To move downward: Prices began to slide.
b) To return to a less favorable or less worthy condition.
7. Baseball. To drop down and skid into a base to avoid being put out.

Trabalhar a diferença

Interessa-me mais a diferença, a diferença exteriorizada. Interessam-me mais as pessoas cuja noção de serem “diferentes” não é qualquer coisa que tentem esconder, antes algo com que tentam trabalhar.


Michael Cunningham, Entrevista Milfolhas, Público, 3 de Dezembro de 05

terça-feira, janeiro 03, 2006

Positivo em quê?

Hoje, ouvi um sujeito com responsabilidades na Brigada de Trânsito a dizer que a operação Ano Novo teve um balanço positivo.

Morreram oito pessoas (oito!) e 26 ficaram feridas.

Como é que alguém diz que foi positivo? Será que é uma besta? Será que não tem noção de que cada uma daquelas pessoas tinha uma rede pessoal cujos limites são, a olhos estrangeiros, completamente indefinidos e indestrinçáveis? Que as expectativas, o amor, as pequenas merdas do dia-a-dia, o diz que disse e o que não disse, a cor de cabelo, os segredos, o tique, a expressão que só um ou dois conhecem, e tudo o mais que marca a diferença de cada pessoa da nossa vida perdeu-se?

Perderam-se oito mundos, oito. E aquele anormal fala de balanço positivo? Não poderia ter falado em estatística favorável, em dados menos graves? Teve de usar a expressão "balanço positivo"?

Apetecia-me partir-lhe a boca, a sério. E não perdi ninguém. Grandessíssimo filho da puta!

segunda-feira, janeiro 02, 2006

Da plebe

Reis e Rainhas é um filme pujante.

Mas principalmente tem um dos melhores diálogos entre adulto e criança que já vi na vida. Comovente, absolutamente seco e, paradoxalmente, de uma ternura impressionante.

Atenção! Atenção! É tudo o que tenho a dizer.

Como transformar uma roupa de casamento em pijama sexy

Uma das melhores coisas que já fiz este ano foi fazer a limpeza/vistoria do meu guarda-roupa. Perdi para aí 80% da minha roupa, mas tendo em conta o facto de não usar grande parte dela foi um ganho de espaço extraordinário!

Apercebi-me também que tenho de ir às compras, não gosto de ver tanto espaço desocupado.


(um grande bem haja para a inês, a prima que adora estas coisas e conseguiu convencer-me a empreender este feito)