sexta-feira, julho 06, 2007

Contra-cultura Pop ou Pop in progress

Ontem fui pela primeira vez, aos trinta anos, a um festival de música (o Avante é muito mais que isso). À partida, um festival que tem no nome uma marca de cerveja promete, nem que seja uma ligeira (ou talvez não) ressaca no dia seguinte. Mas Scissors SIsters promete muito mais, uma vez mais, que a cerveja. E então lá fui eu assistir ao fenómeno, com convite no bolso.

Eu sou fã sobretudo de concertos com cadeiras confortáveis, sobretudo nas primeiras filas, sobretudo de música brasileira. Mas se há uma oportunidade de dançar, nunca a recuso. E esta era uma delas.

Cerveja na mão, atitude expectante e receptiva, estado físico geral bom ou razoável são as condições mínimas para entrar no espírito. Mas o importante talvez não sejam os concertos.

Vista geral - uma das coisas que salta à vista é a presença dos patrocinadores. O mercado impera, mesmo que ilusoriamente possamos pensar que estamos numa "cena alternativa". A quantidade de stands promocionais, com uma variedade estúpida de animações idiotas, é invejável. Talvez seja por isso que se têm estes nomes no cartaz, mas não há que enganar: além da música, um festival é um veículo para as marcas, um chamariz comercial, uma oportunidade para uma vez mais vender.

Vista detalhada - quando cheguei ao "recinto", começou o concerto de Gossip, que gosto q.b., mas que não ouço especialmente. Ora, esta banda (concerto brilhante, brilhante) tem uma vocalista gorda, mas gorda. Com uma voz e uma energia inacreditáveis, a sujeita é uma verdadeira guerreira da performance. A seguir, foram os TV on the radio, que pouco me dizem (aproveitei para comer e beber mais), que têm três membros negros, entre eles um vocalista e um baterista giraços como tudo. Logo depois, Scissors Sisters (nunca mais passam por Lisboa sem eu lá estar, garanto), com a sua atitude completamente queer, outrageous e debochada. Ora, temos, em linguagem corrente, uma gorda, um preto e uma bicha louca como vocalistas de algumas das principais bandas da noite. Se isto não é contra-corrente, não sei o que será. E não será por acaso que os Interpol, com o seu vocalista louro, hetero, depressivo, tenham tido uma prestação monótona e entediante (bem sei que não é a opinião geral).

Vista pessoal - as pop-stars podem ser verdadeiros motores da mudança de mentalidades. A Madonna e o George Michael são (a Madonna já foi mais) verdadeiros impulsionadores da emancipação sexual. Bono, Sting, Angelina Jolie, Lady Di e mais uma vez a Madonna dão a cara por causas humanitárias e ambientais a toda a hora (excepto a Di que ja foi ao ar e o Sting é um bocado parvo, mas pronto). "A gorda, o preto e a bicha" representam isso. Representam a contra-cultura (mesmo que seja comandada pelo mercado, não tenho ilusões) e a capacidade de invadir os lares conservadores (assumidos ou não) com figuras esteticamente desagradáveis para tantos e, mais importante, com estilos de vida fora da norma. Mas nem tudo são rosas, porque a devida distância que a estrela pop está dos seus fãs relativiza a imagem. Ou seja, uma estrela é excêntrica, não é real e não apela ao reconhecimento - é simplesmente um ser de outro planeta. Além disso, o público tende a normalizar e a integrar a sua diferença no seu modelo, como um sujeito que, tendo adorado Scissors Sisters, disse "eles têm aquela atitude toda queer, mas até não passaram das marcas", como quem diz "até se portaram bem para paneleiros". Ou o discurso genérico do "ela é gorda, mas é fantástica", como se à partida se esperasse menos da gorda. Ou o facto inequívoco de o preto ser um giraço ser muito mais relevante do que o branco ser giraço exactamente por ser preto, e isso ser muito mais exótico e atraente. Mas, ainda assim, "a gorda, o preto e a bicha" são fundamentais, por todas as gordas, pretos e bichas que há por aí, e por toda a luta contra o preconceito. Da mesma maneira que a Jolie é fundamental, porque mostra que boazona branca consegue ser uma "ganda maluca" e ao mesmo tempo andar a fazer campanhas humanitárias. Embora a tendência do público seja pensar que a puta virou santa (um pouco como a Madonna, aliás), como se não houvesse mais e mais ínfimas possibilidades.

Uma palavra final para o prazer de andar pelo recinto e encontrar amigos.

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8 Comments:

At 6/7/07 12:57 da tarde, Anonymous Anónimo said...

ainda nãoi de ler mas como é um post tão grande decidi apresentar já a minha 1ª dúvida...

desde quando a madonna defende causas humanitárias?????

responde-me

 
At 6/7/07 12:58 da tarde, Anonymous Anónimo said...

comentário 2:

andas um bocado virada para este lado não andas?!!!

(a este comment não precisas responder porque já te sabias que o ia publicar e já nos rimos ahahha eheheheh hihiihih)

 
At 6/7/07 1:12 da tarde, Blogger ana vicente said...

A madonna???? fizeste mesmo essa pergunta? quem és tu? não te conheço!

então a madonna anda em áfrica de um lado para o outro (especificamente no Malawi), é uma defensora da causa contra a sida, é amiga do bob geldof, defende a paz, já para não falar da causa dos homossexuais, vai entrar no life earth, etc. etc.

ela tem uma voz social. tem uma postura política. isso para mim é suficiente. (já para não falar de defender o direito de dançar)

 
At 6/7/07 4:23 da tarde, Anonymous Anónimo said...

então e o sting?

sim que isto de cantar 2 ou 3x por 1 causa não lhes dá o direito de aparecer na mesma frase que Bono e a angelina.

O bono até os óculos escuros emprestou ao anterior Papa!!!!

A qualquer momento começo a comentar sobre o festival. juro.

 
At 9/7/07 9:31 da manhã, Blogger ana said...

hum...

vista geral
acho especial piada ser a música alternativa (definida como oposição à música pop ou comercial) ser tãaaooo usada pelo marketing (principalmente de telemoveis). nenhum dos grupos que actuou dia 5 contribui para isso, mas block party (que actuou dia 3) sim, e há mais uns quantos (white stripes, para dar mais um exemplo)

vista detalhada

não vi gossip com muita pena nem scissor sisters por motivos de força maior (preservação própria, ahahaha), mas sim, tv foi bem mais excitante que interpol, no que diz respeito à actuação.
é verdade, o moço devia estar deprimido. assumo.
mas é um grande grupo na mesma, daqueles de ter todos os cds e não fazer questão de ir aos concertos.

em relação às figuras públicas e seu papel político.

misturares o sting com a jolie ou o bono é abuso, concordo com a sandera. a madonna fez muito pelo mundo fazendo muito por ela. acho que foi muito relevante em causas não ligadas com africa mas importantes.

concordo com "a Jolie é fundamental, porque mostra que boazona branca consegue ser uma "ganda maluca" e ao mesmo tempo andar a fazer campanhas humanitárias"
agora não concordo nada que ela fosse vista como puta, nada nada.
como boazona e actriz de filmezitos da tanga, sim, mas puta não, isso não.

de resto? é para repetir ou não?

 
At 9/7/07 4:59 da tarde, Anonymous Anónimo said...

bem hajas Ana S.
juntas iremos levá-la ao caminho da luz... ou então não que a cachopa às vezes dá-lhe para isso.

E gostava de te elogiar pela frase:
a madonna fez muito pelo mundo fazendo muito por ela

Era isso que queria dizer mas a minha limitação verbal não mo permitiu. 1 novo bem hajas.

( e tu ana v. não te irrites senao tenho de contar aqui em publico que há uns meses dizias que as musicas da madonna nao eram assim grande coisa e fui eu que te chamei à realidade)


quanto ao festival e aos festivais em cima o que dizer?

são buéda bacanos.


ihihihihi


* e lembra-te que é suposto adorares esta minha capacidade de me focar em migalhinhas e nao no grande bolo1

 
At 10/7/07 12:44 da tarde, Blogger ana vicente said...

realmente vocês são excepcionais a desviar a atenção que realmente (me) interessa. De qualquer modo, é sempre um enriquecimento da conversa.

Em relação ao Sting, coloquei-o propositadamente por uma questão de pioneirismo e de charlatice. Foi pioneiro nesta coisa das causas das estrelas, quando começou a defender a amazónia e mainãoseiquê, quando essas mensagens não estavam propriamente na moda. E é um charlatão porque mais tarde quando se virou para o sexo tântrico, disse que a maior parte das coisas que disse foi porque lhe disseram.

em relação a repetir, só mesmo com bilhete gráteees e/ou com bandas mesmo boas. de outro modo, duvido.

 
At 13/7/07 5:17 da tarde, Blogger ana margarida said...

Não estive lá mas é como se estivesse! Quero mais "reportagens de acontecimentos sociais".

 

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