domingo, julho 01, 2007

Se a liberdade chega atrasada... abra-se a porta mesmo assim

Às vezes, morre uma personalidade pública e tenho uma reacção semelhante, do género: "ah, pensava que já tinha morrido". É um bocado difícil ficar consternada pela perda.

Uma criança de seis anos fica surpreendida quando alguém lhe diz que em Portugal homens não podem casar com homens, nem mulheres com mulheres. É um bocado difícil explicar como algo tão natural para ele possa ser proibido.

Tive, na última sexta-feira, o mesmo tipo de espanto quando soube da nova lei que reconhecia que crentes não católicos "passam a poder casar na sua comunidade religiosa sem ter que passar pelo registo civil". Ao que parece, só a Igreja Católica beneficiava dessa benesse, talvez pelos tratados e acordos (parece que se chamam concordatas a estes esquemas) entre Vaticano e este nosso Estado. Agora, crenças, ou melhor igrejas, que existam em Portugal há mais de 30 anos podem celebrar casamentos "válidos" sem recorrer passar pelo civil. As ditas "outras" confissões passam a ter "credenciais" suficientes para efectivar uma união reconhecida pelo nosso Estado.

De entre essas igrejas, conta-se a muçulmana e a judaica, com tanto ou mais tempo neste território como a católica, sofrendo apenas de uma distinção, talvez um pormenor: sempre neste território se tentou expulsá-los. Pois bem, a Inquisição falhou. Ainda os há, quem diria, assim como evangélicos e adventistas e vai-se a ver, não tarda nada, reinos de deus e manás.

Se pudéssemos apelar ao nosso coração cristão, sem passar pelo amargo peso da Santa Fé, já há muito tempo que esta medida estaria vigente. Como aliás pensei e daí o espanto. Ou nenhuma tem validade ou todas têm. Mas não! Só em Junho de 2007 se lembraram de expandir a liberdade religiosa ao sagrado sacramento chamado casamento. (Chamei-lhe sagrado sacramento? Peço desculpa, deve ser ainda da santa lavagem cerebral instituída.)

Às vezes, estamos numa festa animada e, distraídos, pensamos que o convidado especial já chegou e, quando nos aparece à porta, ficamos surpreendidos. Isso não é razão para não o recebermos bem. Pelo contrário, devemos recebê-lo ainda melhor, porque afinal ainda não tinhamos dado por falta dele.

Por isso, devemos regozijar-nos por esta lei tardia, sobre a qual não tinhamos nunca pensado e que em pouco afectará as nossas vidas, porque ela traz consigo um pouco mais de liberdade e orgulho. Afinal, muita gente deve ter lutado por ela, muita gente deve ter esperado muito tempo por ela. Para eles, mas por todos nós, devemos celebrá-la.

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