segunda-feira, março 06, 2006

Foice

O Lourenço devia ser dos homens mais belos que conheci. Mesmo com 70 anos, era evidente que era um homem bonito. Uma espécie de Mastroianni, com um pouco de Cunhal. Era uma figura sonante, se assim se pode dizer, com uma presença distinta do resto da família. Provocador e fumador, num contexto de conciliadores não-fumadores. Diferente do resto da minha família. O Lourenço não era bem da minha família, mas é claro que era da minha família. É da minha família. Habituei-me, cresci a vê-lo, a ouvi-lo, a temer as suas investidas humorísticas, demasiado agressivas para o meu pouco swing infantil. Tinha frases emblemáticas que recordamos sistematicamente, como a célebre e angustiante "não faças a esta o mesmo que fizeste com as outras" dirigido indirectamente às namoradas que eram apresentadas à família, para ver se aguentavam o primeiro impacto. A mim, dizia-me sempre um "não te percas" que me deixava baralhada. Era um sacana dos bons. Dos melhores. Um verdadeiro alentejano, rijo, sobrevivente quando os médicos anunciavam que já era suposto estar morto, sempre com uma graçola pronta para o que houvesse. Era admiravelmente ele, sem pudor.
Ficará sempre assim no meu álbum de memórias, com essa força e esse (aparente?) desprendimento.

Hoje, a minha palavra vai para a prima, principalmente, e para o primo rato puto. Para eles, um beijo, um abraço forte, um carinho especial. Odiamos todos a morte, mas o que nos junta é mesmo o amor.

1 Comments:

At 6/3/06 4:54 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Mesmo sabendo que este post não precisa de comentários não posso deixar de deixar o meu beijo para a Inês e para o Puto.

 

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